Marcelo Amadei, diretor do Bambalalão.
Entrevista realizada por Izaías Correia
Marcelo Amadei Barbiellini Jr é um dos profissionais mais importantes da história da tevê brasileira. Amadei foi criador e diretor de alguns programas muito conhecidos da Tv Cultura como “Quem Sabe, Sabe” que ficou por 8 anos no ar, “Jazz Brasil”, “Vestibular da Canção”, além de ter criado e dado nome ao excepcional programa “Enigma”.
Para a TV Bandeirantes, adaptou e dirigiu o game-show francês que no Brasil se chamou “O Melhor de Todos”. Dirigiu o “Mulheres” na TV Gazeta na melhor fase daquele programa. Marcelo Amadei também esteve presente na infância de muita gente, no comando do programa “Bambalalão”, por isso o InfanTv conversou com ele sobre esse infantil inesquecível.
“Minha relação com a imagem é séria e acabou
em casamento, mas começou como brincadeira.”
Marcelo Amadei
INFANTV – Amadei, como começou essa trajetória tão vitoriosa na Tv? Você sempre quis trabalhar em televisão?
MARCELO AMADEI – Eu já era jornalista quando foi criada a Escola de Comunicação e Artes – ECA. Até por tradição familiar, pois sou neto, filho e pai de jornalistas.
A profissão estava para ser regulamentada e achei natural fazer o curso superior de jornalismo da USP. Até então, só havia o da Cásper Líbero, que na época era fraquinho. Só não me sentia muito confortável com tal “sina”. Não por falta de vocação, mas porque, como todo jovem, não queria ter uma vida assim tão previsível. Gostava de escrever, embora sentisse mais atração pela imagem. Principalmente cinema e fotografia.
Minha relação com a imagem é séria e acabou em casamento, mas começou como brincadeira. Com brinquedinhos, mesmo. Quando garoto, ganhei de meu avô um “polioptcon”, que era um kit de lentes com que se podia montar binóculos, microscópio, lunetas, etc. Tive também um “laboratório fotográfico infantil”. Em 1950, pouco antes da inauguração da TV no Brasil, eu e meus irmãos pegamos sarampo. A TV bem poderia dar conta de entreter três crianças presas num quarto, né?… Só que ela não chegou a tempo. Meu pai comprou um projetor de cinema 16 mm e vários filmes para nos distrair. Como no final de Casablanca: foi o início de uma bela amizade. Porém, ver e rever os filmes acabou não sendo o bastante para mim. Passei a projetá-los de trás pra diante, cortando fotogramas, reeditando cenas. Até montava e desmontava meu novo amigo a ver o que mais ele podia fazer.
No cinema de meu outro avô, em Santa Bárbara d´Oeste, eu assistia às sessões de dentro da cabina de projeção, infernizando um pouco a vida do velho Sebastião, o projecionista. Tião era o meu Alfredo, como o do Cinema Paradiso. Além de maravilhoso, o filme tem valor especial para mim: toda vez que o revejo vem à tona emoções da minha própria infância.
Já adolescente, acompanhava minha irmã Marli, que foi modelo fotográfico dos Brinquedos Estrela e da Mentex, nos cliques do German Lorca – um dos maiores fotógrafos do Brasil. Ver de perto o trabalho do mestre estimulou ainda mais meu gosto pela arte da fotografia.
Sou formado em Rádio e TV pela ECA. Mas havia feito minha matrícula para o curso de jornalismo. Como tive boa média de aprovação no vestibular e as vagas para jornalismo eram as mais disputadas, havia a possibilidade de mudar de curso no segundo ano. Quis estudar cinema, só achava difícil seguir carreira em mercado de trabalho tão restrito. (Fazer cinema no Brasil da época era como ser astronauta, pilotar Fórmula-1, sei lá… Carreira para poucos, né? Mais uma forma genial – e cara – de expressão artística do que propriamente uma profissão). Gostava também de Rádio e TV. Pedi a transferência e nunca me arrependi. Sou formado na primeira turma. Mais tarde, voltei para lá como professor, por alguns anos.
INFANTV – E o trabalho na televisão?
MA – Já trabalhava em televisão. Só que não via isso como trabalho. Eu tinha uma banda de rock (The Hits) com um programa semanal na TV Paulista, Canal 5 (predecessora da atual Rede Globo). O programa chamava-se Ritmos da Juventude, apresentado por Antonio Aguilar. Adorava a agitação de uma TV feita inteiramente ao vivo. Pura adrenalina. Tão divertido que nem pensava nela como uma atividade profissional. Fiquei encantado e contagiado pelo mundo mágico dos estúdios: câmeras, luzes fortes e todo aquele trabalho dinâmico e criativo dos produtores, escritores, atores, cenógrafos e técnicos operando seus fantásticos equipamentos. Acima de tudo, as pessoas incríveis com quem passei a conviver. (Como “Os Incríveis”, hehehe). Gente como Roberto Carlos, por exemplo, que tive o privilégio de acompanhar em sua primeira exibição na TV aqui em São Paulo e em muitas outras vezes, na Jovem Guarda; Rita Lee, que era minha vizinha e colega no Liceu Pasteur. Um universo tão fascinante que – como diria Luís Guimarães no famoso soneto: – Resistir quem há-de?…
ITV – O Bambalalão é um dos mais lembrados programas pelos “infanautas”. Eu recebo muitos e-mails de pessoas recordando com carinho o infantil. Como você vê esse carinho até hoje?
MA – Com alegria e emoção. Muitas dessas crianças são ou foram meus alunos nas faculdades onde leciono. Outras, já casadas, até lamentam que seus filhos não tenham um Bambalalão para assistir, embora ainda existam bons programas infantis – sobretudo na Cultura. Entre os fãs do programa estavam meus próprios filhos – que já me deram netinhos maravilhosos.
ITV – Como nasceu o Bambalalão?
MA – Na mente privilegiada da Gigi. Ela já é bem conhecida como apresentadora, além de atriz e escritora. Há ainda muito mais de competência, seriedade e talento naquela cabecinha linda.
Foi de fato um privilégio dirigir o Bambalalão. O mérito da ideia original deve ser creditado à minha querida amiga Gigi Anhelli, pioneira titular e absoluta da série. Mais do que apresentadora, a Gigi era a própria cara do Bamba. O programa teve início despretensioso, mas logo mostrou todo o seu potencial, levando a TV Cultura a apostar mais forte naquela iniciativa tão promissora. Para assumir o Bambalalão, deixei a chefia da divisão de variedades da Cultura, trazendo alguma experiência aprendida no Vila Sésamo e na direção de outro infantil: o Curumim. Eu também havia estudado televisão educacional no Japão, especialmente a programação voltada para jovens. Estimulamos, no “Bamba”, um ambiente de intensa liberdade. Éramos um time, mesmo. O elenco, a equipe de produção e a técnica tiveram participação decisiva na evolução criativa do programa. Até os bonecos ajudavam, pois tinham quase vida própria. Pode parecer meio maluco, mas eu batia grandes papos com eles quando estava fora do ar. Veja bem: eu conversava muito com os bonecos e não apenas com seus manipuladores! Sinto-me, sim, orgulhoso por ter feito minha parte. Também me envaidece ter sido professor da Gigi no curso de Rádio e TV da USP. Aliás, ajuda hoje a iluminar o meu caminho a satisfação de ver ex-alunos se dando bem por aí…
ITV – O elenco do programa foi imortalizado por quem o assistiu. Como é que Gigi, Silvana, Marilan Sales, Chiquinho Brandão, Fernando Gomes e todos os outros foram escolhidos?
MA – A Gigi começou tudo, com o palhaço Tic-Tac (Marilan) e a Memélia de Carvalho, que construía e manipulava com muita arte os seus bonecos. Macaco Chiquinho, Maria Balinha e João Balão foram as criações pioneiras e inesquecíveis da Memélia no “Bamba”. Tinha o professor Poropopó (genial Chiquinho Brandão). A Memélia trouxe dos Estados Unidos um leãozinho, que deu para o Chiquinho manipular: o Bambaleão, que se tornaria enorme sucesso. Logo surgiu o Carlinhos Bambalarino, que, antes era professor de história, sabia? E foram chegando outros gênios que fizeram a história do “Bamba”, como Gérson de Abreu, com um talento ainda mais gordo do que ele e que nem dá pra classificar: ator, cantor, comediante, manipulador de bonecos… Aliás, o critério natural para os que permaneceram no Bambalalão foi justamente a versatilidade. Todos faziam de tudo. Os três nos deixaram e serão para sempre insubstituíveis. Como o também saudoso Chekmati. Todos se foram muito jovens. Silvaninha entrou para substituir a Gigi que estava em férias. Acabamos ficando com as duas. Tinha a criativa atriz Helen Hélène, que contava historinhas a partir de qualquer elemento. Fazia coisas como botar a xícara de café pra conversar com uma escova de sapato. O Álvaro Petersen (Beiral), além de ator e desenhista acabou se revelando um hábil manipulador de bonecos. O incrível Fernandinho Gomes, que começou garoto, como fã do programa e viria a construir (e manipular) alguns dos mais fantásticos bonecos da televisão brasileira. Tinha o Xyzz. Outros mais foram chegando, como a gracinha da Briela. O ator Acaiabe tornou-se o nosso grande contador de histórias. E veio a Dulce, atriz de primeira classe. Depois que Tic-Tac saiu, tivemos outros palhaços muito engraçados como Pam Pam e Perereca. E o mágico Bazard… Só estou falando da turma que ficou por longo período. Mas, sempre procuramos estimular novos valores. Promovemos até concursos de bonecos. Na verdade, muitos ótimos artistas passaram pelo “Bamba”, ao longo da série. Se não permaneceram foi por vários e diferentes motivos, não por falta de qualidade. Alguns apenas reluziram com o brilho dos cometas. Mas iluminaram o “Bamba”.
ITV – Como diretor eu sei que é difícil responder, mas como telespectador do Bambalalão qual era o seu apresentador preferido?
MA – Todos adoráveis, mas a número 1 era mesmo a Gigi.
ITV – Você ainda tem contato com o pessoal do programa?
MA – Não muito. A gente se esbarra por aí. Moro pertinho da sede da “Coisa” (lembra do Agente G, programa da Record com o inesquecível Gérson de Abreu? – Com o Gerson mantive contato por muitos anos, até ele nos deixar.) Álvaro Petersen e Acaiabe moram perto aqui de casa. Costumávamos caminhar juntos pelo bairro, antes do Acaiabe ir para o Rio participar do Sítio do Picapau Amarelo. Fernandinho Gomes e o próprio Álvaro criaram, a meu pedido, um boneco, o repórter Ex, para o programa “Mulheres”, quando eu o dirigia. Uma curiosidade: o Ex foi uma invasão da programação infantil de TV na adulta, sabia? A Ana Maria Braga adorou e também quis ter o seu. Assim nasceu o louro José. O Ratinho, em entrevista que deu ao Ex, gostou tanto que quis nos contratar – a mim e ao Álvaro – para seu programa. Claro que não fomos, mas sugerimos a ele a criação de um boneco próprio, que também ficaria famoso: o Xaropinho. Silvana volta e meia está nos palcos de teatro e continua linda, como a Gigi. As duas serão lindas por toda a eternidade. Memélia, Tic-Tac, Helen, Dulce nunca mais vi. Mas, sei que estão bem e, passe o tempo que passar, serão sempre grandes amigos. Ainda vou encontrá-los por aí… Saudades de machucar o coração eu sinto pelo Gérson, Chiquinho Brandão, Carlinhos Bambalarino e Chekmati. E mantenho amizade com todos os operadores técnicos, que davam banhos de competência.
Depois do Bamba, fiz outros trabalhos com Álvaro Petersen, Fernandinho Gomes, Sílvio Galvão (cenógrafo, aderecista, figurinista) – todos “crias” do programa. Trabalhei também com o Zama (autor da musiquinha do Bambalalão). A roteirista Rosana Rios, que escreveu tantas histórias inesquecíveis para o nosso teatrinho continua por aí, autora consagrada de livros infantis. Saudades dela e do Chiquinho Ardito, figura maravilhosa da produção a quem devemos muito. Ardito segurava qualquer rojão! Nunca mais o vi. A Gigi eu vejo com certa frequência. Agora mesmo estamos na mesma empreitada, criando a Associação dos ex-alunos da ECA-USP. Andamos conversando também sobre outro projeto que talvez a gente faça, mas ainda é segredo, hehehe! (Posso adiantar que não é “A Bela e a Fera”).
ITV – Em 1982 o programa passou a ser transmitido ao vivo. Qual a razão desta proposta?
MA – O Bambalalão era diário. Ao vivo de manhã e reprisado à tarde, sem qualquer tipo de edição. Assim, não havia diferenças significativas entre as duas formas de exibição. Mas, em geral programas gravados (que são montagens) costumam ter características completamente diferenciadas. Costumo dizer que são duas mídias distintas: TV e TV ao vivo. Talvez este nosso espaço seja um pouco apertado pra gente aprofundar essa questão…
ITV – Mas vocês encontraram muitas dificuldades em se adaptar ao programa ao vivo?
MA – OK, você venceu! Vamos aprofundar um pouquinho: começa pela espontaneidade. Num programa ao vivo, todo mundo se comporta com naturalidade. É o formato mais adequado para se lidar com crianças – que são naturais e espontâneas por natureza. O elenco também trabalha com maior responsabilidade e empenho, pois não se pode errar. Mas, é claro que se erra! Ótimo, porque os erros acabam tornando a coisa mais divertida. Menos “certinha”.
ITV – O “Bamba” divertia, mas também ensinava. Isso traz a sensação de ter contribuído para formação de muitas crianças na época?
MA – Sim. Acima de tudo. Se divertir as crianças já nem é pouco, contribuir para sua formação é fundamental. E dá à nossa vida um sentido mais profundo de realização. O mesmo que costuma motivar os professores para além de qualquer salário. Somos artistas, não professores, mas aquece o coração saber que fizemos alguma diferença. Converso muito hoje com jovens cidadãos, pais de família exemplares que, quando crianças, não perdiam o programa. Todos falam da influência benéfica que o Bambalalão exerceu sobre suas vidas. É gratificante e sempre emocionante.
ITV – Durante os quase 13 anos em que o programa ficou no ar, teve algum dia “mais importante” que os demais? Algum dia em que o Bambalalão te proporcionou algo diferente?
MA – No começo, o Teatro Franco Zampari – onde fazíamos o “Bamba” – ainda não tinha instalações apropriadas de TV, como cabine de controle (switcher) e essas coisas. Transmitíamos o programa a partir de uma carreta estacionada nos fundos do teatro. Quase como se fosse uma externa. Num certo dia 11 de novembro, bem no meio de um programa, vieram me avisar que o Gérson e o Acaiabe estavam brigando na coxia (atrás da cortina que fica no fundo do palco). Se fosse verdade, seria briga feia pelo tamanho deles. Eu, muito ingênuo, fui lá “apartar”. Fiquei no meio dos dois. Qual não foi minha surpresa, quando ambos me agarraram, um em cada braço, e me empurraram para dentro do palco. Toda aquela armação – ao vivo – era só para me prestarem uma homenagem por ser o dia de meu aniversário. Acaiabe contou uma história escrita pela Rosana especialmente para mim: “O Rei de Olhos Azuis”. (E agora eu era o rei! Pode?…) Enquanto Acaiabe contava, Beiral ia pintando meu retrato. Guardo o quadro e a gravação até hoje como lembrança de uma das maiores emoções que já senti na vida.
ITV – Ainda hoje, muitos “infanautas” mandam e-mails lamentando o fim do Bambalalão? Por que o programa acabou?
A Turma do “Bamba”MA – E eu é que sei? Os Beatles também acabaram (que modéstia, hein?). Não acho que deveria ter acabado, mas… Tive outros programas na TV Cultura que também acabaram e poderiam estar no ar até agora. A série JAZZ BRASIL, por exemplo. Ainda hoje ouço reclamações, principalmente do primeiro time da MPB. Os próprios artistas sempre colocaram a série como uma referência da música brasileira na TV que nunca deveria ter saído do ar. Ou o QUEM SABE SABE, que permaneceu por tantos anos. Assim como há outros programas excelentes na história da televisão brasileira que nem chegaram perto de tal longevidade.
Veja o caso do ENIGMA. Eu me lembro bem do Jô Soares reclamando – no JÔ ONZE E MEIA – que não se conformava com a Cultura ter encerrado a série, que ele adorava. Muita gente tem saudades do VESTIBULAR DA CANÇÃO. Estou, é claro, puxando a brasa pra minha sardinha. Mas, quantos ótimos programas de outras emissoras também já acabaram? Faz parte do show-business.
Por outro lado, o “Bamba” permaneceu no ar por uma dúzia de anos. Não são tantos os casos de sucesso assim! Mas, eu acho que ele bem poderia regressar… Ah, sim!. Já vi pesquisas com essa pergunta – se o Bambalalão deveria voltar – e praticamente cem por cento das respostas foram afirmativas. A maioria ficou até bem entusiasmada com essa possibilidade.
Uma coisa é certa: depois do Bambalalão, em cada um dos outros maravilhosos programas infantis que a Cultura criou, podia-se ver um pouco do “Bamba”. Mesmo nos atuais. Ele fez escola. Assim como se podia ver no próprio “Bamba” a influência de programas anteriores, como o Vila Sésamo, também produzido pela Cultura (na premiada adaptação brasileira) e que tinha sido uma revolução na programação para o público infantil. Bebemos nas fontes certas. A TV Cultura sempre teve – continua tendo – os melhores programas para crianças. Não é obra do acaso. É um processo construído com seriedade ao longo de anos. Para essa evolução, é natural que os programas, mesmo os melhores, abram espaço para novas propostas. Às vezes, a pequenina casa cresce tanto que se torna um castelo (hehehe).
ITV – Com o fim do programa ficou a vontade de voltar a trabalhar com o público infantil?
MA – Adoro crianças. O Grande Chefão lá em cima sabe disso e deve me ver com simpatia. Tanto é que Ele me mandou três netinhos lindos de presente e que são loucos por mim. É verdade. Sinto até certa ciumeira na família por isso. Dizem que tenho açúcar. Na verdade, brinco com eles como alguém igual. Não só com os meus netos. Eu me dou muito bem com todas as crianças porque elas sabem que jogo no time delas. Continuo meio criança e não me envergonho disso porque meu eu superior também é. E é divino. A criança que mora na alma da gente é aquilo que temos de melhor. Basta prestarmos atenção e ela. Ter feito programas infantis com amor e dedicação foi um privilégio. Dizia o velho Chacrinha que quem não se comunica se estrumbica! Pois a criança é o desafio maior que existe em comunicação. Criança é sincera e verdadeira. Com ela não tem enganação: ou você entra na sua sintonia ou um abraço e tchau mesmo. Quando se consegue completar essa ligação, a recompensa vale o esforço. Eu ficaria sim, muito feliz em voltar a fazer programas infantis.
Ter trabalhado com a criançada também me trouxe maior responsabilidade profissional, mesmo quando faço programas para adultos. Explico: é que não consigo deixar de ver crianças na audiência adulta. Hoje em dia criança vê tudo na TV. Sempre tem alguma na sala assistindo ao que você produziu. Infelizmente, muitos não levam isso em conta.
ITV – Você assiste aos programas infantis atuais?
MA – Assisto. Principalmente os bons. Os ruins eu só vejo por necessidade profissional.
As emissoras comerciais produzem ótimos e péssimos programas infantis. O que entristece é a desproporção. A quantidade destes últimos, isto é, programas sem o menor respeito às crianças, vistas só como consumidoras de produtos – e estimuladas a pressionar os pais a comprarem isso ou aquilo – é grande demais. E quando os pais não podem? É muito cruel!
ITV – Eu falava sobre as pessoas que sempre recordam do programa, mas você acha que falta zelo por parte das emissoras com a memória da nossa televisão?
MA – Falta memória, sim. Apaga-se muita coisa por economia. As emissoras não dispõem de estoque ilimitado de fitas de videoteipe. Aí, a vantagem econômica da regravação se volta contra o público de hoje e contra a sociedade de amanhã. Conservar alguns programas traz uma complicação: Quais? Com que critério? Porque é claro que não se pode preservar tudo!
Eu acho, modestamente, que tenho uma boa solução:
Pensando para o futuro, sugiro uma parceria entre as emissoras com o Governo e com as escolas de comunicação para a criação de uma espécie de CONDEPHAT do Rádio e da TV. Funcionaria assim: todo programa considerado importante seria “tombado” como patrimônio cultural do Brasil. As emissoras não teriam que arcar nem com os custos dessa preservação – que seria absorvido pelo Estado – e nem com o trabalho – que ficaria a cargo de estudantes e professores de Rádio e TV. Estes atuariam tanto na avaliação e escolha dos programas a serem preservados, quanto na própria operação do sistema. Que tal? Talvez alguém com algum poder político bem pudesse apoiar essa minha proposta, hein?…
ITV – Nesses anos todos de televisão, ficou alguma mágoa do “meio televisivo”?
MA – O ambiente da TV é competitivo demais. Ótimo campo para estudos sobre a vaidade humana. Ali, não é raro a esperteza vencer o talento. Pessoas sem caráter, falsidade, hipocrisia e “puxadas de tapete” existem em qualquer lugar, não são um privilégio nem do rádio nem da TV. A questão é de volume. Digamos que o número de velhacos por metro quadrado seja maior. Gente que passaria por cima da própria mãe para subir na carreira. Noves fora as bajulações, fofocas, maledicências… Do lado de lá da telinha tem muito pão bolorento. Justamente por isso é que devemos valorizar ainda mais aqueles que conseguem sobreviver íntegros, éticos, dignos. As flores no pântano. Não são poucos. E são essenciais.
ITV – Amadei, muito obrigado pela entrevista. E eu gostaria que você deixasse uma mensagem para o pessoal do InfanTv.
MA – Ah!… Mas eu também gostaria de receber uma mensagem: marcelo.amadei@terra.com.br.
Já viram aqueles adesivos no vidro de alguns carros que dizem: consulte sempre um advogado?… A minha mensagem é: consultem sempre a criança que mora dentro de vocês!